Um pai solo, de 37 anos, entrou na Justiça para conseguir uma licença-maternidade para cuidar do filho, Henry, de quatro meses. Tiago de Oliveira Costa é médico tenente da Marinha do Brasil e, mesmo comprovando ser o único responsável pela criança, não conseguiu o direito ao benefício estendido, no Hospital Naval de Brasília, onde trabalha.
“Eu não estou pedindo dinheiro, nada. Estou pedindo para cuidar do meu filho. Eu sei que a Justiça não está preparada. Nem sei se a sociedade está preparada para casos como o meu. Mas o mundo tá evoluindo, né?! As coisas estão mudando, e tem outros pais solo na mesma situação. Eu preciso mostrar o que está acontecendo”, afirma Tiago.
A redação questionou a Marinha sobre o caso, mas não obteve resposta até a publicação desta reportagem.
De acordo com o médico, a vontade de ser pai já existia “há muitos anos”, mas, somente em 2019, com a carreira já consolidada e a vida mais organizada, que ele começou a se mobilizar para realizar esse sonho.
“Entrei com contato com clínicas de fertilização, me inteirei sobre os procedimentos jurídicos, documentação necessária, e fui atrás de uma barriga solidária, para começar o processo”, conta Tiago.
No entanto, somente em 2020 o processo de fertilização pode ser feito. Em outubro do ano passado, uma amiga de Tiago foi a barriga solidária de Henry. Durante a gravidez, o militar foi alertado sobre as dificuldades de um homem conseguir uma licença-maternidade .
Caso na Justiça: licença-maternidade x paternidade O médico, então, procurou um advogado, que já havia atendido um outro pai solo, e foi orientado a notificar o Hospital Naval e a empresa onde também trabalha. Na empresa, um conselho jurídico entendeu que a licença de 180 dias seria para o interesse da criança e concedeu o benefício.
Porém, o Hospital Naval levou o caso de Tiago Costa para as instâncias superiores da Marinha do Brasil. A corte entendeu que, por ser pai, o militar teria direito apenas à licença-paternidade, de 20 dias.
O advogado de Tiago entrou com um pedido na Justiça, para que a corporação concedesse a licença de 180 dias (seis meses), mas também recebeu uma resposta negativa.
O juiz que analisou o caso justificou que “o Poder Judiciário não pode criar um regime misto que consagre, via de regra, ao mesmo agente, direitos de pai e mãe por escolha pessoal. […]”.
“Entendo que em situações excepcionais, inesperadas, como, verbi gratia, a morte da mãe durante o parto, poder-se-ia adotar uma situação que melhor atendesse o interesse do menor, mas não na espécie, onde tal circunstância foi fruto do planejamento antecipado do autor, que já sabia de antemão das limitações naturais e legais”, afirmou o magistrado.
Segundo o pai solo, a decisão da Justiça foi “extremamente preconceituosa”. “O juiz podia negar, claro. Mas não precisava fazer esse tipo de comparação, de gênero”, lamentou Tiago.
Médico tenente da Marinha, no Hospital Naval de Brasília, Tiago de Oliveira Costa teve Henry em junho deste ano — Foto: Arquivo pessoal
‘Licença-maternidade’ para pai solo Depois da negativa, Tiago abriu um novo processo na Justiça pedindo uma licença para adoção, que concede 120 dias. O caso do médico aguarda decisão da juíza Maria Cândida Carvalho Monteiro de Almeida, da 9ª Vara da Seção Judiciária do Distrito Federal, que ainda não tem previsão de uma decisão de primeira instância.
Em outubro, ao analisar um caso semelhante, o Supremo Tribunal Federal (STF) começou a julgar a constitucionalidade da extensão da “licença-maternidade” a pai solteiro servidor público. A decisão deve ter repercussão geral e, por isso, caso seja favorável, passará a ser adotada pela justiça brasileira.
Na reprodução humana assistida escolhida, a gestante não é considerada mãe do bebê, e o pai genético torna-se o único responsável pelo recém-nascido após o parto, como é o caso do militar. Por isso, o genitor é chamado de “pai solo”.
Bloqueado nas redes sociais Depois que Tiago começou a falar sobre a sua luta para conseguir a licença para cuidar do filho, ele diz ter sido alvo de uma ataque hacker em sua rede social do Instagram.
O militar conta que na semana passada, teve o perfil invadido. “Depois disso, eu não consegui mais acessar minha conta do Instagram, pois mudaram minha senha”, explica. “Meu perfil não foi bloqueado pelo próprio Instagram porque não tinha nada que violasse as regras ou diretrizes do aplicativo”.
Tiago afirma ainda que já relatou o caso de invasão de seu perfil para o Instagram, mas ainda não recebeu resposta da rede social.